terça-feira, 5 de dezembro de 2017

7 DEZ (5.ª) | CICLO D' OUTONO | O Relicário do Santo Espinho do Dr. Anastácio Gonçalves: Versão oitocentista de uma obra-prima da ourivesaria europeia medieval




Hugo Miguel Crespo
Centro de História da Universidade de Lisboa


Animado por múltiplos e sucessivos historicismos e revivalismos, o século XIX caracteriza-se pela reprodução, variação, pastiche ou mesmo cópia enganadora de obras-primas do passado que serviam não apenas uma função pedagógica, já que segundo a tradição académica é pela cópia que se assimilam os modelos e as estéticas do passado e também as preciosas técnicas oficinais que num período pós-revolução industrial se temia virem a perder-se, mas respondiam de igual modo à ânsia coleccionística da sociedade burguesa de então. É neste contexto de renovação das artes aplicadas e sua didáctica que surgem os grandes museus de artes decorativas, tais como o Museum of Manufactures, hoje Victoria and Albert Museum em Londres em 1852, ou o k.k. Österreichischen Museums für Kunst und Industrie (Museu Imperial Austríaco de Arte e Indústria), hoje Österreichisches Museum für angewandte Kunst (Museu de Artes Aplicadas) em Viena em 1863. Também os novos avanços tecnológicos, nomeadamente quanto à reprodutibilidade rápida e pouco dispendiosa de peças complexas e únicas, como a invenção da galvanoplastia (1838), foram fundamentais para a criação de modelos que, servindo de objecto de cópia por novas gerações de artistas e artesãos, vieram rechear de forma expedita estas novas colecções museológicas. Não estranha portanto que uma obra-prima da ourivesaria europeia, o Relicário do Santo Espinho outrora no Tesouro Eclesiástico em Viena (Geistliche Schatzkammer, hoje Tesouro Imperial ou Kaiserliche Schatzkammer), sabemos hoje encomendado por Jean, Duc de Berry cerca de 1400-1410, tenha sido alvo de reproduções mais ou menos fantasistas - como o objecto da presente conferência, adquirido pelo Dr. Anastácio Gonçalves em 1959 - e também de uma cópia fraudulenta que veio a substituir o original, hoje conservado no British Museum, Londres. Através da análise material e técnica da peça adquirida por Anastácio Gonçalves, comparando-a com o original no museu londrino, e também da apreciação estética e espiritual do Relicário do Santo Espinho no seu contexto de produção medieval, traçaremos o seu percurso custodial atribulado e surpreendente.




Nota biográfica 
Licenciado em Publicidade & Marketing pela Escola Superior de Comunicação Social do Instituto Politécnico de Lisboa e Mestre em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação pelo Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa do Instituto Universitário de Lisboa, é, desde 2009, bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia no Museu Nacional de Arte Antiga em Lisboa onde desempenha funções no departamento de comunicação.

Os seus interesses pelo colecionismo e os mercados da arte levaram a que participasse na Pós-graduação em Mercado da Arte e Colecionismo da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas de Lisboa.

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